A castração pediátrica é a castração de animais em idades jovens. Este procedimento cirúrgico tem causado alguma comoção entre os amantes de animais devido à preocupação com os seus efeitos secundários no desenvolvimento e a ética de submeter animais tão jovens a um procedimento cirúrgico. Mas qual serão as evidencias a favor e contra a castração pediátrica?
O que é a castração pediátrica?
A castração pediátrica é uma gonadectomia (remoção das gónadas sexuais) em animais antes das 16 semanas de vida. Nas fêmeas faz-se a remoção dos ovários (ovariectomia) ou ovários e útero (ovariohisterectomia) e nos machos a remoção dos testículos (orquiectomia).
Muitos estudos abordam as vantagens e desvantagens da castração. Mas poucos avaliam a idade de castração na saúde animal. Um estudo demonstra que não há alteração na saúde ou comportamento em animais castrados antes dos 6 meses de vida, comparando com castrações mais tardias.
Anestesia e cirurgia em filhotes
O cão ou gato devem estar saudáveis para serem submetidos a qualquer cirurgia. Nos gatinhos e cachorros, a vacinação não é necessária para a castração pediátrica uma vez que o animal encontra-se protegido pelos anticorpos maternos que adquiriu ao beber o colostro (primeiro leite) nas primeiras horas de vida. A desparasitação interna (vermes) e externa (parasitas) também deverá estar feita.
Cuidados durante a cirurgia pediátrica
Durante a cirurgia, os principais cuidados relacionam-se com a hipotermia, hipoglicemia e stress pré-anestésico. Para evitar o stress, os animais devem manter-se com a ninhada e progenitora. Já a hipotermia é combatida mantendo a mesa cirúrgica quente e administrando fluídos aquecidos. A hipoglicemia pode ser combatida com administração de glicose no soro, bem como a rápida introdução de alimentos após acordar da cirurgia.
Na castração cirúrgica, o tempo de cirurgia é reduzido. Já existem protocolos seguros para a anestesia pediátrica de cães e gatos. O procedimento da castração é semelhante à realizada em animais adultos, com a excepção de que a escala é menor. Em machos, poderá esperar-se pela descida dos testículos ao escroto (12 a 14 semanas no cão, no gato estão à nascença) e pelo fechar do canal inguinal (por onde descem os testículos) aos 7 meses.
Vantagens da castração pediátrica
A principal vantagem da castração pediátrica é o controlo populacional, que poderá ajudar a reduzir o número de animais de rua e abandono animal. Sabe-se que apenas 50 a 60% dos animais adotados das associações são castrados, mesmo tendo ajudas de custos. Para evitar a reprodução não desejada, muitas associações optam por fazer a castração pediátrica antes da adoção. Para além de reduzir o número de animais à procura de casa, os filhotes castrados são mais procurados pelos adotantes e menos abandonados.
A castração parece melhorar o comportamento e saúde
A castração também ajuda a controlar comportamentos sexuais, como a marcação com urina, monta, fuga, cio, fuga em procura de parceiros e agressão. Castração de felinos antes dos 5.5 meses de idade levou a redução de asma, abcessos, agressão e marcação com urina. Em cães, a castração antes dos 5.5 meses levou a redução de episódios de ansiedade de separação e marcação com urina.
A castração precoce reduz o risco de cancro e infeção
Ainda existe redução na incidência de cancros mamários, principalmente quando a castração é feita antes do primeiro cio. Por exemplo, gatas não castradas tem 7 vezes maior risco de ter cancro de mama comparado com gatas castradas.
A piometra (infeção do útero que ocorre em gatas e cadelas) também é prevenida pela remoção do útero. A cura da piometra faz-se exatamente pela remoção do útero, mas durante a infeção o risco da cirurgia é maior devido à presença das bactérias e dos seus tóxicos. A prevenção permite evitar esta patologia, que afeta até 25% das cadelas com mais de 10 anos.
A castração previne problemas da próstata
Nos cães machos é comum haver a hipertrofia prostática benigna, com o aumento do número de células (hiperplasia) e tamanho (hipertrofia) da próstata. Esta ocorre em 50% dos cães com 2 a 3 anos de idade.
A castração reduz o estímulo hormonal na próstata, levando à perda de tamanho e resolução dos sintomas. A redução de tamanho da próstata também leva ao decréscimo do risco de infeção. A remoção dos testículos também impede o aparecimento de tumores testiculares, que afetam quase 1% dos cães mais velhos.
Desvantagens da castração pediátrica
Pensa-se que a castração pediátrica possa estar relacionada com alguns problemas, no entanto estas relações ainda são mal compreendidas. Entre as desvantagens encontram-se o aumento de problemas ortopédicos e possíveis infeções do sistema urogenital.
A castração pediátrica é mais segura porque não há o risco de o animal estar no cio, o que aumenta o risco de hemorragia durante a cirurgia. As complicações são mais suaves e a incidência menor em animais jovens.
A castração pediátrica não afeta negativamente o comportamento
Estudos científicos parecem ainda não apresentar consenso em relação aos efeitos negativos da castração pediátrica no comportamento. Alguns estudos tentam relacioná-la com aumento da agressão ou do ladrar em cães, mas fazendo-o em cães de canil já com problemas ou não avaliando o efeito do treino e raça.
Outro estudo sugere que há perda das capacidades cognitivas precocemente nos cães castrados mais cedo, o que não foi comprovado com análise dos tecidos do cérebro. Já em gatos, nenhum efeito negativo foi reportado. Pode concluir-se que ainda não existem provas que demonstrem a castração pediátrica tenha efeitos negativos no comportamento.
Poderá haver relação com o aumento do risco de alguns cancros
Alguns cancros têm sido associados a animais castrados, como linfossarcomas, osteossarcomas e hemangiossarcomas. No entanto, ainda não há explicação de como se poderá relacionar com a castração. A relação poderá ser apenas com o aumento da esperança média de vida de animais castrados, que sendo mais velhos terão maior incidência destes cancros.
A castração precoce está associada a maior risco de problemas ortopédicos
Os problemas ortopédicos são mais comuns em animais castrados, como a rutura do ligamento cruzado cranial no joelho. Ainda não se conhece a causa mas pensa-se que se relaciona com a alteração de estruturas de crescimento do osso, possivelmente relacionado com a ausência de hormonas sexuais. A displasia da anca em cães machos também parece aumentar com a castração, sendo a castração precoce aumenta a incidência mas reduz a severidade.
A castração precoce aumenta o risco de infeção urogenital
Os genitais de cães e gatos castrados precocemente (antes da puberdade) mantêm-se infantis, apesar de ainda não se conhecer por completo as suas consequências. Pensa-se que a manutenção de vulvas juvenis em cadelas se relacione com dermatite perivulvar e vaginite crónica. Cadelas castradas cedo também parecem mais predispostas a desenvolver cistite (inflamação da bexiga) e incontinência urinária.
A castração pode potenciar a obesidade
A obesidade também poderá ser uma consequência da castração. A obesidade em animais relaciona-se com o decréscimo do metabolismo por falta das hormonas sexuais e falta de adequação da ingestão calórica. No entanto, a obesidade pode ser facilmente prevenida com o controlo da alimentação do animal quando adulto.
Conclusão
A castração pediátrica é uma ferramenta segura e eficaz no controlo populacional de cães e gatos, contribuindo para a redução no número de animais abandonados. A anestesia e cirurgia pediátricas são seguras, tendo menos tempo cirúrgico e de recuperação pós-cirúrgica. Ainda há vantagens no comportamento e redução de risco de alguns cancros e infeções.
Como qualquer procedimento médico, há sempre riscos como a maior incidência de outros cancros, problemas ortopédicos e infeções urogenitais. No entanto, as vantagens conseguem contrabalancear os riscos.
Portanto, a castração pediátrica de cães e gatos não é um procedimento a temer ou mistificar. É um procedimento que é realizado há mais de 30 anos e com protocolos definidos.
Nas associações e colónias selvagens, permite o controlo da população menos intrusivo e preservando o bem-estar animal. Para os cuidadores, fica à sua escolha quando realizar o procedimento tendo em consideração as vantagens e desvantagens de o fazer a uma idade mais precoce ou avançada.
Referência: Margaret et al. 2014
Estou com 4 gatos filhotes programados p/ castração com 19 semanas (5,5 meses de nascidos. Apesar do cirurgião ser competente e me passar confiança, sempre temo que lhes possa intercorrer algum problema urogental. Posso ficar tranquila que vai dar tudo certo? Pois hã entre os veterinãrios que conheço opiniões diverfentes.
Olá Teresinha,
Se o seu médico veterinário conhece a técnica, não vejo porque não o possa fazer. Como falamos neste artigo baseado na literatura cientifica atual, a castração pediátrica pode ser realizada com segurança, tendo algumas desvantagens (o que todas as práticas clínicas o têm).
Abraços,
Joana Prata